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Amanhã não será um dia melhor
do que hoje, que não é um dia
melhor do que ontem.
Há um sentimento fúnebre no ar,
de quem tem vivenciado
uma morte após a outra,
de quem tem vivenciado,
antecipadamente, mais uma
morte, a última delas, a morte
após a própria morte, a morte
da qual não se tem retorno,
a morte da qual os mortos
não voltam dela para a vida,
a morte a que apenas os vivos
se encaminham para ela
sem jamais poder voltar,
a morte da qual não se tem
poemas para se fazer,
não a morte simbólica,
mas a outra, a real,
a experiência final da morte
em vida, da qual sobrevivemos,
se tanto, ainda que neste mundo,
enquanto fantasmas desossados,
descarnados, desfigurados,
que berram na tentativa de evitar
a morte e de evitar, a todo custo,
a morte em vida.
Berramos em vão.
Não assustamos mais ninguém
com nossos berros.
São eles, antes,
os inassustáveis, que nos assustam.
A cada momento, tentamos aprender
a fazer, fantasmaticamente,
o improvável luto de nossas
mortes, o que, quando conseguimos,
é tão somente de um modo
individual, jamais coletivamente.
Nunca aprendemos a fazer
o luto coletivo do que matou
e torturou muitos de nós, nunca
aprendemos a fazer a luta coletiva
contra nossa história de horror,
que permanece torturando e matando.
Os torturadores e assassinos
estão vivos, viveram em família
sem ser incomodados, falam
em nome da família e de Deus.
Este crime hediondo não pode entrar para o rol de crimes insolúveis.
Eles não podem continuar impunes, andando, livremente pelas ruas e shoppings de nosso país, para destruir outras famílias.
Quando se perde os pais, perde-se o passado, quando se perde um filho, perde-se o futuro.
Quem ainda está vivo não diga o que é seguro não é seguro, as coisas não continuarão a ser como são depois de falarem os dominantes falarão os dominados.
Assim como o sangue de Abel clama por justiça, o sangue de Lucas clama pela terra, o sangue de Cristo faz a reconciliação com o mundo.
Há sangue no grito rasgado da garganta que arranha.
Há sangueda voz que me calam, da voz que me escorre sangra e apanha.
Há sangue nas mãos deles e de todo vermelho luta da voz calada de Lucas terra.
O secretário do diabo e seus dois demônios continuam com títulos de pastores esperando uma próxima ovelha para levar ao matadouro,
ao abatedouro.
A matança.
Ao extermínio.
A carnagem.
A carnificina.
Ao morticínio.
Ao occidio.