sábado, 30 de outubro de 2021

Poema sobre as notas da fome

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A fome é indecente para quem sente, no entanto, vamos comemorar os recordes da colheita.
A fome é uma forma de violência contra o mais fraco.
A fome é uma arma de guerra, mas o programa mundial de alimentos não pode edificar a paz sozinho.
A fome é uma tragédia planetária que são usadas em crises prolongadas, mas com manipulação mais sutil dos mercados, do comércio e de ajuda do que com ataques diretos.
A terra é perfeita para a produção, para exportação de tudo o que se produz.
As pessoas já falavam de meninos se alimentando de luz.
Agora definiram o destino: a morte lenta.
Nosso povo já não aguenta mais saber o preço do quilograma da carne. 
Morrer não é opção, mas viver é uma necessidade.
Matar uma nação que mais produz é um comportamento que denota ausência de coragem.
Se alimentar de luz ficou caro também.
Miséria, toneladas de grãos, nosso povo de mãos atadas, de barriga vazia, olhos sem expressão.
No lixão, a fome supera gênero e cor:
homem, mulher,
branco, preto,
nenhum direito 
à alimentação.
E para não impactar: insegurança alimentar e não FOME.
Muda-se o nome, mas não se combate o bicho que corrói a barriga do nosso povo,
não se modifica o setor agrário.
Como é difícil ser fazendeiro,
empresário!.
Fácil é ser povo.
Fácil é colocar o país, de novo, no mapa da fome, para enriquecer o agro,  
que é tech,
que é pop,
que é tudo,
que torna mudo quem deveria ter voz.
Enquanto não for nós subindo no caminhão para catar lixo e garantir o almoço, não será o fundo do poço, a praga, a peste.
A seca só incomoda quando chega ao Sul e ao Sudeste. 
No Centro, no Norte, no Nordeste, é normal.
A fome acontece apenas com quem não tem fé.
Quem colhe o café não consegue beber;
o leite que o operário ordenha
é só para o filho do fazendeiro;
a menina do caixa não tem dinheiro,
o açougueiro não pode comer carne, 
o operário não pode se aproximar
quando a obra que fez termina. 
O escravo da mina
morre sem ter um grama de ouro
ou mesmo salário.
O repositor de Hortifruti não consegue ter legumes, frutas e hortaliças dentro da sua própria casa.
O vendedor de calçados não consegue ter dinheiro para comprar tênis para os seus próprios filhos.
A vendedora de roupas não consegue mas vê a sua própria filha com a mesma roupa rasgada.
O vendedor de eletrônicas não consegue comprar a sua própria televisão.
O frentista não consegue encher o tanque de gasolina do seu próprio carro.
É difícil demais ser empresário no Brasil.
É difícil demais ser feliz ontem, porque ontem já se foi.
Também não conseguem ser feliz amanhã, porque amanhã ainda será.
Num tempo onde “ser feliz” se tornou uma tirania do existir, encontro com pessoas que esqueceram de viver para se entregarem, não raras vezes de forma louca, a uma busca por um tipo felicidade que jamais poderá ser encontrada.
Você é feliz?.
Se você é feliz, o que é ser feliz para você?.

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