terça-feira, 28 de junho de 2022

Morro todos os dias

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Eu não deveria conhecer tantas pessoas.
Eu sinto as dores delas.
Eu sinto as dores do mundo.
Sofro com diagnósticos.
Sofro com perdas.
Sofro com as perdas dessas pessoas.
Sofro e morro um pouco por dia.
Morri muitos poucos diários no auge dessa pandemia.
Sofri com o descaso desse governo genocida que agora, em campanha, se autoelogia quanto ao enfrentamento da mesma, "com responsabilidade social".
E os órgãos que andam dizendo que vão combater fake news nessas eleições fingem não ver essa terrível fake news.
Morri  muitos poucos por dia no período em que rede social se tornou obituário.
E "depois" da pandemia, vieram as mortes pelas doenças não tratadas durante a mesma.
E muitos outros poucos de mim continuam morrendo.
E continuo sentindo as dores do mundo.
Então não sei muito bem o que dizer.
Só abraçar, só sofrer junto, só torcer, só declarar apoio e apoiar de fato.
Nada de frases prontas.
Acho desonesto dizer a alguém que "vai ficar tudo bem", quanto esse tudo bem não depende de mim.
Eu não posso oferecer garantias.
Não tem destinos certos, não tem vitórias sempre, não tem ninguém escolhido e ninguém rejeitado, não tem curas automáticas.
Tem lutas, com perdas e ganhos.
Tem exames, médicos, tratamentos.
Acesso a médicos e tratamentos ainda não é para todos.
E isso é bem triste.
E pessoas pobres ainda morrem de doenças das quais os ricos não morrem.
Pessoas morrem.
E nós não queremos morrer.
Nem queremos que os nossos morram.
Mas não nos envolvemos com as dores dos povos indígenas que o Estado vem matando, de novo, através de seus agentes ou de outros assassinos que Empoderador.
Eu venho sentindo dores de índios, dores de pretos, dores da sigla inteira, dores de mulheres,  dores de crianças, dores de chefes de família, dores de quem, assim como nos anos 80, precisa fazer devoluções de produtos fundamentais no caixa do supermercado porque o dinheiro não deu.
Sinto dores de ativistas e de mães e pais de ativistas.
E tenho medo de provocar essas mesmas dores em quem me ama.
Mas os meus medos de me calar,
de ser omisso, de me guardar são maiores que meus medos de morrer, de ser morrido.
E eu tenho dores de mim.
E minha cabeça barulha, e dói.
E eu quero dormir e não tenho tempo.
Para dormir,  basta deitar, sentar escorregando no sofá.
Durmo fácil e muitos.
Mas me mantenho acordado o maior tempo que posso.
"Viver é coisa perigosa."
Eu não tinha que conhecer tanta gente.
Eu escrevo para não enlouquecer.
Eu não tenho talento para herói ou para mártir.
Eu só sinto as dores do mundo, eu enfrento a morte todos os dias.
Se afirmo isso, é pelo orgulho que tenho de vocês, pois estamos todos unidos com Cristo Jesus, o nosso Senhor.

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